18/9/97 — 3:03
Dou comigo de repente sentindo ternura por mim próprio: ao que eu me reduzi por causa do meu Mestre! Pareço uma abelha à volta de uma flor, sempre à volta da mesma flor, poisando nela agora e depois e depois, para ir buscar um néctar inesgotável, já no limite das suas forças, de tanto voar. É como se não conhecesse mais que uma flor: se se afasta, é só para ir colocar a doçura na colmeia e logo volta; se se retarda no caminho, é só porque lho enredam, ou porque precisa de descansar um pouco, mas flores não conhece mais nenhuma. E lá está ela de novo à volta da mesma flor, à espera não sei de quê, talvez do melhor jeito ou lugar para poisar, mas nem poisando descansa, porque logo parte a colocar na colmeia o tesouro que leva.
— Quando acaba, Mestre, este vai-vém, e morro, enfim, entre as pétalas da flor? E diz-me: não estou pecando ao sentir esta ternura por mim mesmo? Não é uma pieguice ridícula, a que fiquei reduzido, por não pensar em mais ninguém senão em mim?
— Em ti? Não é na flor e no néctar que sempre pensas? Não é em encher de alimento os favos?
— Sim, à primeira vista parece não haver aqui lugar a egoísmo, mas sei lá… Esta ternura por mim mesmo, donde me vem?
— De ti mesmo, não?
— Não é sinal de degenerescência? Não é uma fixação doentia em mim mesmo?
— Pobres crianças, o que o estado adulto vos fez!
— O estrado adulto?
— Sim: o caminho que percorrestes para vos afastardes de Mim!
— O que é o estado adulto, Mestre?
— É não precisardes mais de Mim.
— É por isso que complicamos desta maneira, a ponto de já não sabermos distinguir a mão direita da esquerda, o amor do egoísmo?
— Pobres crianças! Porque Me fugistes do Coração, onde tudo era claro?
— Ensina-me então de novo: donde me vem a ternura por mim mesmo, Mestre?
— De ti mesmo. Não é claro?
— Sim, parece óbvio…
— E onde tens o problema? Alguém vos proibiu de vos amardes ternamente a vós mesmos?
— Agora que assim perguntas…absurdo parece, de facto, que alguém não tenha um carinho especial pelo seu próprio ser: o nosso próprio ser é o que está mais próximo de nós, é ele que inteiramente nos acompanha no prazer e na dor, é ele que apanha com todas as perguntas que fazemos e arranja o melhor que pode todas as respostas, é ele que é massacrado desde o início com quanto o rodeia e tem que se desenvencilhar de tudo… Ah, Mestre, é bem verdade: como não havemos de sentir uma profunda ternura por este ser que, quer gozando, quer sofrendo, mais que ninguém nos ama?
— Vede o que fez de vós Babilónia, a Cidade que construístes tão longe do meu Coração!
— Então diz-me, Mestre: o que é o egoísmo?
— O egoísmo é não deixardes os outros amar-se a si mesmos.
— E quando fazemos nós isso?
— Quando pretendeis sujeitá-los ao vosso amor.
— Que acontece então ao natural amor por nós próprios quando assim pretendemos dominar os outros?
— Fica sem tempo para si mesmo e deste modo acaba por se esvaziar e destruir.
— Então o egoísta é o que menos se ama a si próprio!
— Todo o acto de egoísmo é um acto de desprezo por si próprio.
— És tão lógico, Mestre! Mas é preciso rebentar a carapaça das coisas para chegar à Tua Lógica!
— E como rebentaste a carapaça das coisas?
— Foste Tu que a rebentaste! Não foste Tu que me trouxeste para este Deserto?
— É aqui que se rebentam as muralhas que escondem a Verdade, sim, Meu amigo. E sabes porquê?
— Porque aqui há Silêncio.
— Tem assim tanta força, o Silêncio?
— Leva tudo raso à sua frente! É como uma luz que alastra e, no seu avanço, trespassa e pulveriza todo o obstáculo.
— E o amor…o que é? Já sabes? O que é amar o próximo?
— É ajudá-lo a amar-se a si mesmo.
— Descansa então agora um pouco, Minha abelhinha!
São 5:12.
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