17/9/97 — 3:51
— Do fundo do Teu cansaço, fala comigo, Jesus. Atrevo-me a pedir-Te isto, porque sei que Tu és Palavra sempre e quanto mais a Tua Carne esmorece e se cala, mais o Teu Coração se ouve. Fala comigo, Mestre, Coração com coração. Queres saber o que tenho no meu?
— Quero.
— Frieza. Parece que toda a vida foi esterilizada.
— Não desistas de procurar. Vai sempre mais fundo. O teu coração não é onde te encontras; é mais além.
— Esta aridez gelada não é no meu coração?
— Vê bem: desejas essa aridez?
— Não!
— Desejas que ela desapareça?
— Desejo.
— Muito-muito?
— Com toda a minha capacidade de desejar.
— E crês que o teu desejo se cumprirá?
— Às vezes esmoreço na minha Fé, Mestre. Há tanto tempo me recobre esta aridez…
— E ficas aflito quando sentes a tua Fé esmorecer?
— Fico.
— E lembras-te de Mim quando assim sofres pela fragilidade da tua Fé?
— Lembro. É a Ti que me agarro sempre. Como agora, vês?
— Que estavas pensando antes de começares a escrever este texto?
— Que numa situação assim, de absoluta aridez, tudo quanto escrevo só pode ser construção minha.
— Tua – de quem?
— Como?
— De quem é essa construção – do homem da aridez, ou do homem que a deseja encher de água?
— Nunca gostei de escrever; se o faço, não é certamente a aridez que me move.
— Que te move, então?
— Tudo o que existe para além da aridez.
— Existem então coisas para além da aridez!?
— Existem; acabas de mo mostrar: o desejo de acabar com ela, a Fé, a confiança em Ti quando a Fé vacila, a permanente preocupação em que estes textos não sejam construção minha…
— E mais isso que estás sentindo agora.
— Ah! A mágoa de estar parado, sem conseguir escrever, à espera das Tuas palavras?
— Não estava isso também para lá da aridez?
— Estava, de facto.
— E essa preocupação, que agora te estava percorrendo, de vigiares ao menos duas horas Comigo…
— Ah, Mestre, mas eu estava desejando que as duas horas passassem!…
— Desejar que passe uma coisa incómoda é próprio da aridez?
— Não: a aridez não deseja nada. Mas desejar que as horas passem não é ofender-Te?
— Vês-Me desejando que se prolongassem as horas do Meu Getsémani e depois as horas todas da Minha Paixão?
— Não; vejo-Te como um de nós: desejando que tudo se consumasse depressa, mas sem forçar nunca o tempo do Pai.
— Pretendes forçar o Meu tempo em ti?
— Não. Mas desejo tanto que venhas depressa…
— Desejas agora?
— Desejo sempre. Agora também, sim.
— Vem-te da aridez esse desejo?
— O desejo não vem da aridez, mas é a aridez que o provoca… Ah, Mestre, estou vendo agora: tudo aquilo de que falámos e que está para além da aridez é, no fundo, provocado pela aridez!
— Falta só mais um pouco, Meu pequenino: preciso ainda da aridez para te moldar o teu coração novo….
São 6:17!
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