A imagem que geralmente os Profetas
transmitem é a de alguém clamando num deserto. E não os imaginamos certamente
gritando a sua mensagem frente a dunas de areia e a penhascos despidos de toda
a verdura; sabemos muito bem de que Deserto se trata: o que nós vemos é ouvidos
moucos e corações insensíveis. É a nossa própria experiência que no-lo diz: há
um Deserto feito de pessoas que não nos ouvem, que não nos entendem, que não se
preocupam connosco, que nos usam, que passam por nós como um rolo compressor
cilindrando os nossos mais vivos sentimentos, que se cruzam connosco a grande
velocidade, agredindo-nos como uma tempestade de areia. De um deserto de areia
sai-se; deste, o da insensibilidade dos corações, é impossível sair.
Então construímos abrigos, instalamo-nos o
mais confortavelmente que podemos dentro desses pequenos oásis artificiais.
Sair daí, só com muito cuidado. Os Profetas são dos poucos que saem para as
dunas lá fora, dispostos a enfrentar a agressão das tempestades. E daí clamam,
avisam, insistem. Denunciam. Anunciam. No meio da euforia espalhafatosa, falam
de falsidade. No meio de esperas resignadas, falam de Esperança. No meio da
Devastação, falam de Vida pujante. No meio do Desamor, falam de Amor – Amor
fiel, Amor louco. No meio da Aspereza, falam de Ternura. Até que caem para o
lado, chorando, sem forças para mais. Porque o Torvelinho passa, desaustinado,
e ninguém ouve nada. Isto tem que parar. Alguma coisa tremenda terá que
acontecer aqui…