Já
aqui declarei várias vezes que não me foi concedido o dom da “visão mística”,
nem o da “audição interior”. Isto encheu-me de dolorosas dúvidas, no princípio:
por um lado eu “sabia” no meu íntimo que Deus me pedia que escrevesse e que
seria Sua a Palavra que ficasse escrita; mas por outro lado não me eram dadas
palavras prontas a escrever, nem imagens prontas a descrever. Eu tinha só a
obsessão de ouvir Deus, que Ele próprio me levara a amar pessoal e
incondicionalmente. Mostrou-me depois que esta é a única condição necessária
para O ouvirmos e vermos com exactidão.
No
meu quarto, 6/12/94
– Como começo, Jesus?
– Não comeces; continua.
– Não sei como continuar: não tenho assunto
para este diálogo.
– Mas tenho Eu. Não te basta?
– É exactamente isso que eu quero: que
fales!
– Então invoca a Minha Presença.
– Não estás já presente?
– Não suspiras tu por uma Presença mais
real? Invoca essa Presença que tu queres!
– Jesus, vem!
Queria tanto ver-Te!
Queria tanto ouvir-Te!
Diz de novo “Epheta!”
para que os meus ouvidos se abram!
Senhor, se quiseres podes curar-me!
– Quero! Fica curado!
– Jesus, foi mesmo assim que Tu disseste?
– Não
ouviste assim?
– Eu não ouvi nada!
– Porque escreveste então aquelas palavras?
– Porque estão no Evangelho e lembrei-me
delas.
– Então foi uma temeridade! Como te
atreveste?
– Não sei. Eu não quero ofender-Te de
maneira nenhuma!
– Que sentiste ao escrevê-las?
– Temor e tremor.
– Mesmo assim escreveste-as. Porquê?
– Porque me lembrei delas, Jesus! Já to
disse!
– Seguiste uma simples lembrança…
– Lembrei-me de uma coisa boa, não?
– Porque olhaste agora as horas?
– Porque me lembrei.
– Que horas eram quando olhaste?
– 3:15.
– Que diferença fazem estes algarismos para
os da hora em que te levantaste e te ajoelhaste?
– Eram 2:46. A diferença é que estes
algarismos são todos pares e os outros são ímpares.
– E isso que tem?
– Fiz ontem uma constatação: os números
ímpares estão, para mim, sempre relacionados com a Realidade Divina; os pares
têm sempre a ver mais ou menos directamente com a nossa realidade humana.
– Conta o que sentiste ao levantares-te
perante aqueles algarismos.
– Não estavas Tu entre eles e tive medo. Uma
esquisita sensação de solidão. Ainda por cima o 6 relaciono-o com o número da
Besta.
– Já te lembraste
de a pôr daqui para fora?
– Tu lembraste-me neste momento.
– Acreditas que fui Eu?
– Acredito, e é a única coisa que tenho de
Ti.
– Não te chega?
– Só Tu sabes se me chega. Eu queria
ouvir-Te e ver-Te. E tocar-Te!
– Achas isso possível?
– Possibilíssimo!
– Então toma!
– Meu Jesus! Não me deixes escrever estas
coisas, se não as cumpres! Sinto-me tão mal! Estou prostrado! Sinto-me… olha,
sinto-me um autêntico aldrabão!
– Porquê? Há alguma possibilidade de não ser
Eu que te falo?
– Há, sim, há! Eu presto para alguma coisa?
Não é fácil o Demónio tomar conta de mim através da vaidade?
– Escorraça-o. Tu sabes como fazê-lo.
– Arcanjo Miguel, pede ao teu Senhor que te
deixe vir com a tua espada flamejante expulsar daqui para longe o Inimigo!
Simão, meu anjo companheiro, não deixes Satanás aproximar-se de mim! Pedro, meu
querido Pedro, pede ao teu Jesus que me não deixe cair em Tentação!
– Não te sentes melhor, agora?
– Não. Sinto-me mal, mal, mal!
– Como? Tenta explicar melhor.
– Vazio.
– Mais nada? Diz isso que te passa agora
pelo espírito.
– Estava para escrever que me sinto
atrevido, presumido, aldrabão.
– Porque não escreveste?
– Porque por outro lado não me sinto nada
daquilo.
– Como assim?
– No fundo sinto que foste Tu que quiseste
que eu escrevesse isto tudo, não sei porquê!
– Mesmo as Minhas promessas não cumpridas?
– Já não é a primeira vez!
– Como? Já te menti alguma vez?
– Não!!!
– Explica.
– Jesus, estás a forçar-me tanto! Está a ser
tão penoso escrever hoje… a esta hora…
– Queres parar?
– Não!!! Quero o que Tu quiseres!
– Então explica as Minhas “mentiras”.
– Isso, Jesus: entre aspas. Porque Tu és a
Verdade e eu acredito em Ti.
– Mas então as promessas não cumpridas…
– Das duas, uma: ou serão cumpridas a seu
tempo…
– Quando digo, por exemplo, “Quero! Fica
curado!”, isto não devia acontecer no momento?
– E aconteceu!
– Como com X?
– Exacto. Tu disseste: “Ela já está curada”!
– E está?
– Está. Irreversivelmente.
– Como explicas então que nada se tenha alterado
no comportamento dela?
– É uma questão de tempo. Aquele
comportamento vai alterar-se exactamente para o comportamento contrário, porque
aquele vem de Satanás e o que vai aparecer nela és Tu, porque lhe tocaste já o
coração!
– Então das duas… a outra é…
– É sempre a possibilidade de eu ter ouvido
mal, de ter ouvido a voz da minha vaidade!
– Então muita coisa nestes escritos pode ser
só a voz da tua vaidade e nessa altura deverás rasgá-los já!
– Rasgava, sim, se mo mandasses! Feliz por
Te obedecer!
– Não terias pena?
– Nenhuma! Para fazer a Tua Vontade vou ao
fim do mundo, faço o pino na praça pública.
– Eh lá!
– Tu sabes que é verdade!
– Olha as horas.
– 4:08.
– Interpreta.
– O 4 são os quatro cavaleiros, os 4 viventes,
os 4 anjos. São os executores da Tua Vontade, os Teus mensageiros. Tu queres
que eu Te anuncie! O 8 é o oitavo dia, o dia da Queda e da Redenção. Tu queres
que eu, pecador, Te anuncie no meio de nós, pecadores, para que sejamos salvos
pela Tua Graça.
– Falta o Zero.
– O Zero é o essencial. É a Tua Presença
inefável no meio da nossa fragilidade. O meu Espírito querido!
– Sentes-te melhor agora?
– Um pouco melhor. Mas sabes que tem sido
horrível!
– Sei. Eu sei tudo o que se passa contigo e
estou a gostar muito do que se passa contigo.
– Assim tal e qual?
– Assim. Fica tranquilo. Eu amo-te muito.
Nenhum mal te acontecerá.
– Não dei barraca neste escrito?
– Este escrito é Meu!
– E as Tuas promessas?
– Já as cumpri.
– És surpreendente, Jesus! Eu ia escrever
“Vou cumpri-las”!
– “Já as cumpri” é que está certo.
– Meu Senhor e meu Deus!
– Deita-te. Não tens sono?
– Não é sono… Sinto-me todo atado… o meu
coração parece prisioneiro dentro de mim. Este escrito saiu-me penosamente.
– Porque o escreveste?
– Porque mo mandaste ontem à noite.
São 4:32.