Conhecemos
certamente muito bem estas palavras de Jesus: Há só um Pai e vós sois todos
irmãos. Há só um Mestre; Eu sou o vosso Mestre. Há um só Pastor; Eu sou o bom
Pastor. Olhamos no entanto para as várias igrejas e aquilo que nos dá nas
vistas a nós e a todo o mundo é, em todas elas, sem excepção, uma organização solidamente
alicerçada e mantida por muitos pais, ou padres, por muitos mestres, por muitos
pastores, todo um conjunto de pessoas que se destacam da grande massa dos
membros comuns e anónimos e que tudo mandam, tudo sabem, tudo controlam e
dirigem na respectiva organização. Seguramente, portanto, não foi isto que
Jesus quis, não é isto que Ele quer. E não desiste do Seu Sonho, por mais
argumentos que amontoemos para Lho não realizarmos. Ora ouça-se:
Admitimos facilmente que uma pequena família possa ser governada pelo
Amor, apenas. Admitimos até que uma pequena comunidade possa ser governada
exclusivamente pelo Amor. Mas já nos custa muito mais imaginar a Igreja
inteira, composta de milhões de pessoas, sem chefes, sem nenhuma hierarquia,
governada toda exclusivamente pelo Amor.
Tem que haver referências – dizemos nós. Tem que haver pelo menos
pessoas que sirvam de exemplo, que coordenem uma actividade conjunta, que
decidam coisas práticas. Tem que haver pelo menos alguém para quem as pessoas
olhem, em caso de dúvida. Nós precisamos de referências visíveis que ao menos
nos sirvam de Sinal apontando o Caminho – insistimos. Nós temos carne, caramba!
– rematamos nós, sinceramente convencidos da nossa sensatez.
E quem sou eu para ver mais do que vós, meus irmãos? Também eu procuro e
creio no que vou encontrando, apenas. E agora de repente julgo ter visto
justamente aqui a resposta para as nossas tão oportunas e sinceras interrogações:
referências e sinais para os outros são sempre e só todos aqueles que procuram
e crêem no que vão encontrando!
De facto o Ensinamento de Jesus é muito claro e insistente neste ponto:
ninguém possui toda a Verdade – a Verdade é Ele, apenas, e é o Espírito que nos
vai conduzindo para a Verdade total. Nós somos todos peregrinos e caminhantes.
Somos Abel, sempre andando à mercê da fome e da sede do Rebanho inteiro. E há
só um pastor deste Rebanho: Ele mesmo, o próprio Jesus.
Não sei que mais vos possa dizer, meus irmãos. Não posso ir para além da
Luz que em cada momento a mesma Luz me vai mostrando. E que podemos, afinal,
fazer todos nós senão seguir em cada momento a Luz que descer ao nosso coração
em resposta às nossas interrogações? O que eu sei, e sabemos nós todos do Evangelho,
é que a Luz não vem deste ou daquele, por mais santo que todos o considerem,
mas está sempre e só no nosso Redentor Jesus. Não posso, de modo nenhum,
afastar-me deste Ensinamento, que Jesus mantém hoje, em todos os Seus Profetas.
Mas a Sua Luz vai avançando sempre. E à medida que avança transforma
aqueles que a recebem igualmente em Luz. E sabemos que, tornados Luz, nos
tornamos Amor. Deste modo, também, obviamente, os nossos companheiros de cada
momento nos podem tocar com os raios da Luz que receberam. Por isso Jesus diz
que onde se reunirem dois ou três, Ele mesmo estará no meio deles. O que
importa, então, é que, ao reunirem-se, cada um deixe brilhar perante os outros
a sua Luz. É esta a forma mais natural de orar: dar testemunho das “maravilhas
de Deus” que Jesus for revelando em cada um. Deste modo a mesma e única Luz
brilha em toda a Igreja e também se detectam as zonas tenebrosas. É preciso
deixar o Espírito agir.
…
Se vivermos tensos procurando a Face do Senhor, até uma criança pode ser
o nosso guia num
momento em que se tenha instalado uma dolorosa dúvida no nosso coração.
Importa, pois, para o governo da Igreja, apenas que uns dos outros ouçamos as
“maravilhas de Deus”: elas próprias orientarão os corações sem os violentar.
Quem diz ouvir, diz ver, diz captar com qualquer um dos cinco sentidos.
A Luz de Deus pode ver-se em simples gestos, em simples atitudes, no
comportamento geral de alguém. Pode saborear-se, cheirar-se, tactear-se no
abraço sensual a uma criança, a um corpo amado. E tenhamos em conta que na
Igreja Refundada nada em nós será excluído do Amor total – obviamente também a
Carne nele participará na plenitude da sua capacidade de sentir.
Deste modo, não precisamos mais de um “magistério oficial”. É que não
haverá mais doutrina nenhuma a definir e a defender: a Luz que nos virá de cada
um será tão diversificada e tão clara, que nenhum sábio será capaz de a
“sistematizar”, nem ninguém que tenha os olhos abertos pela Luz necessitará de
semelhante trabalho. Importa, pois, que de modo algum se institucionalizem os
Carismas individuais; antes se favoreçam. E assim nunca a Igreja se tornará
numa sempre mortífera Instituição. (Dl 28, 14/9/04)
São muitos, aqui, os textos que
poderiam complementar este; o 134 (Julho 2010) e o 575 (Outubro 2011) são particularmente oportunos.