No jardim da casa
Escrevendo ...
Breves dados biográficos

O meu nome é Salomão. De apelido Duarte Morgado.

Nasci no ano de 1940 em Portugal, na aldeia do Rossão, da freguesia de Gosende, do concelho de Castro Daire, do distrito de Viseu.

Doze anos depois, 1952, entrei no seminário menor franciscano: eu queria ser padre franciscano.

Doze anos depois, 1964, fiz votos perpétuos na Ordem dos Frades Menores de S. Francisco de Assis seguidos, ao fim desse ano lectivo, da ordenação sacerdotal: eu era o padre que tanto queria ser.

Doze anos depois, 1976, pedi ao Papa dispensa dos votos que era suposto serem perpétuos e do exercício do sacerdócio, que era suposto ser para sempre, casei e tornei-me pai de quatro filhas.

Doze anos depois, 1988, fiz uma tentativa extrema para salvar o meu casamento, saindo de casa. Mas o divórcio de facto consumou-se.

Doze anos depois, 2000, surgiu na minha vida o mais inesperado acontecimento, que começou a ser preparado, sem que eu disso tivesse consciência, no meio deste ciclo, 1994. Foi aqui que comecei a escrever a longa Mensagem que senti Deus pedir-me que escrevesse em Seu Nome e a que Ele próprio deu o título de Diálogos do Homem com o seu Deus no Tempo Novo. Os textos agora aqui publicados são excertos desta vasta Profecia preparando a sua divulgação integral, no tempo oportuno, que desconheço.


Moro há 30 anos em Leça do Balio, concelho de Matosinhos, distrito do Porto.


Não são estas palavras mais do que um testemunho daquilo que vi, ouvi, senti, toquei. Não estão por isso sujeitas a nenhuma polémica. Todos os comentários que se façam, ou pedidos que se queiram ver satisfeitos, sempre serão respondidos apenas com novos textos: de mim mesmo não tenho respostas.




Observações


Muitos e verdadeiros Profetas têm surgido nos nossos dias. Um deles é Vassula Ryden, cuja profecia, "A Verdadeira Vida em Deus", teve um decisivo relevo no meu chamamento a esta missão e revela uma estreita complementaridade com esta Mensagem que escrevo.

Os algarismos desempenham nesta Profecia um papel muito importante como Sinais. Foram adquirindo progressivamente significados diversos. Assim:

   0 – O Sopro da Vida. O Espírito Santo.

   1 – A Luz. A Unidade. O Pai.

   2 – A Testemunha.

   3 – O Deus Trino. A Diversidade.

   4 – O Mensageiro. O Profeta. O Anúncio. A Evangelização.

   5 – Jesus.

   6 – O Demónio.

   7 – O Sétimo Dia. A Paz. A Harmonia.

   8 – O Oitavo Dia – O Dia da Queda e da Redenção. O Homem caído e redimido. Maria de Nazaré.

   9 – A Plenitude de Deus. A Transcendência. A Perfeição. O Regresso de Jesus. O Nono Dia.

Alguns agrupamentos de algarismos adquiriram também um significado próprio. Os mais claramente definidos são estes:

   10 – Os Dez Mandamentos. A Lei. A Escritura.

   12 – O Povo de Deus. A Igreja.

   22 – As Duas Testemunhas de que fala o Apocalipse.

   25 – A Alma humana.

   27 – Salomão, o meu nome que, derivando do termo hebraico Shalom, significa o Pacífico, a Testemunha da Paz.

segunda-feira, 5 de setembro de 2011

523 — Fica comigo, Jesus!

                                                         Ver nota no início da mensagem 521

 Confeitaria “Márcio”, 11/9/94    DL

    Que escrevo,  Jesus?

   Reza primeiro. Acalma-te.

   Que rezo?

   Reza. Rezar o que é?

   Estou frio. Não sei. Não me ocorre resposta nenhuma. Estou assim muitas vezes. Não te, perdão, Te ouço (Chamou-me a atenção a palavra “ouvir”).

   E então? Já sabes o que é rezar?

   Estar à escuta?

   Isso. Que sentes?

   A caneta querendo inclinar-se como ontem... Mas desapareceu a força que a faz inclinar... Não, é muito débil a pressão, eu consigo contrariá-la... Acabou. Acabou a pressão. A caneta está abandonada ao sabor da minha mão. Esta caligrafia é a minha caligrafia normal. Estou frio. Estou a ficar vazio. Deixado ao sabor de mim próprio não presto. Não tenho poder. Não tenho vida. Sou nada. Nada mesmo.

(Ouço debilmente a voz do Senhor:)

   Tenta exprimir isso.

   Nada. É um vazio, como se todos os órgãos do corpo funcionassem automaticamente, sem princípio coordenador e vivificador... Não fujas, Jesus!

   Eu nunca fujo!

   Então porquê esta sensação de vazio?

   Vazio! Vácuo! Nada! Foi daí que surgiu a Criação!

   Tremo. Escrevi isto n’ “O Oitavo Dia”[1]. Temo que aquilo não tenha sido dito por Ti.

   Não te angusties. A tua mão está há muito tempo a ser guiada por mim, perdão, Mim!

   É tão débil a tua, TUA voz, vês? Tenho que emendar, hesito...

   Continua a escrever.

   O quê, Senhor?

   A tua indigência. Lembras-te do domingo... (Olhei domingo e...)

   Escreve Domingo com letra maiúscula! Lembras-te do Domingo passado?

   Sim, meu Senhor! Disseste-me de manhãzinha que eu iria ter uma surpresa.

   Como disse EU?

   Exactamente assim: “Vais ter uma surpresa”

   Como soubeste que era EU?

   Não sei bem. Soube e acreditei.

   E cumpriu-se o que EU disse?

   Cumpriu. Como cumpriu!

   Conta.

   Trouxe cadernos. Dois cadernos. Eu sabia que Tu querias que eu escrevesse. Era uma sensação agradável e exaltante. Escrever depois de Tu me teres tocado e levantado!

   Isso. Não hesites. Isola-te do barulho do café.

   Eu comecei a escrever sem saber o quê. Pedi-te que escrevesses Tu. “Escreve, Meu Deus!”. No princípio, tudo normal. Depois a caneta fugia-me irresistivelmente para cima, em direcção às linhas superiores. Não entendia. Se eu escrevesse na direcção dessa força, acabava por cruzar as linhas já escritas e toda a escrita ficaria ilegível. Eu tentava segurar a caneta na linha horizontal (eu sempre escrevi muito horizontal e nunca gostei de papéis com linhas), mas era impossível.

   Impossível?

   Sim. Não sei explicar, mas eu sentia que o que se estava a fazer era obra Tua.

   Era a tal Surpresa?

   Isso. Eu tinha a certeza ...

   Certeza?

   Certezíssima que eras Tu.

   E por isso...

   Por isso era impossível resistir-te, perdão, Te! (Quis-me parecer que Jesus sorriu, feliz)

   Como assim? Sentiste-te violentado?

   Não!!! De modo nenhum! Eu queria... eu queria o que TU quisesses! (Senti Jesus tranquilamente feliz. Sem me aperceber disso, passei neste momento a escrever com a caneta em posição anormal: a mão quer manter-se na normal posição de escrever, mas a caneta inclina-se muito para a direita ...). Onde íamos, Jesus? (A caneta voltou à posição normal)

   Na violentação. Na liberdade.

   Custa-me muito a entender isso.

   Tu és só uma criatura.

   Sim. Foi das coisas mais lindas que me ensinaste nos últimos tempos, meu querido Professorinho! (Foi como se Jesus me apertasse a mão).

   Fala nisso.

   Em quê?

   Na ternura. Escreve com maiúscula: TERNURA! Como sabes, ninguém te considera terno…

   Sim. Sou bruto. Casca-grossa. Alheio, aluado. Sem o mínimo de empatia.

(Estou a considerar que “empatia” é uma palavra muito científica, cara, e isto cortou-me o fluxo da Presença – embora sempre débil – de Jesus). Vês? Com tanta facilidade me desprendo de Ti! Prende a minha atenção! Não me violentas! Eu quero! Eu quero muito que tudo o que eu tenho seja teu, perdão, TEU! Vem, Jesus! É Domingo! É o Teu Dia.

   Todos os dias são meus. MEUS! Eu curo ao sábado, mas também à segunda, à quinta ... E posso deixar de curar ao Domingo.

   Como? Estou embaraçado.

   Refiro-me a curas sensíveis. O Domingo é o Dia da cura...

   Que horror, Jesus! Não sei o que estou a escrever. Parece-me ter entrado num beco e ali rodo, sem saber por onde sair. Que sensação! Apetece-me gritar como uma criança perdida: Pai!!! Estou parado à espera que movas a minha mão. Ela controla completamente ou quase – a caneta. Que faço? Deixo de escrever? (Martela-me na cabeça com insistência – embora sonolenta a ideia de que estava a explicar algo que interrompi. Tenho que ir ler, para saber o que é... Que sensação horrível! Abandonado num deserto. Sem ter certeza de nada, nem da exactidão, nem da sinceridade das palavras que escrevo. Mas continuo escrevendo. Sinto muito vagamente que é isso que Jesus quer. Eu sei, mas só com a “cabeça”, que Jesus está aqui. Escrevo sem convicção, paro muitas vezes, seco... Vagamente senti agora que devia acabar a explicação da escrita do Domingo passado. Afinal não foi preciso ir reler. Debilmente, Jesus:)

   Vá, Salomão, explica o Domingo.

   Explico a quem?

   Explica. O resto não é contigo!

   Eu sentia a caneta violentamente dirigindo-se para cima, para cima. A última palavra que está no texto é “Escrevo”. Eu ia a dizer qualquer coisa como “Escrevo”... não, agora me lembro, eu não sabia absolutamente nada do que ia escrever a seguir. Eu só sabia que tinha que escrever. Subitamente, ao verificar a direcção da caneta para cima, para o alto, cruzando-me as linhas todas já escritas, para não “borratar” o texto todo com palavras (que aliás não me vinham ao espírito, nenhuma!), a caneta passou a fazer traços, traços leves, aqui, ali, sempre para cima, como que inutilizando todo o texto escrito. Por fim um pouco até voltados para a esquerda, no canto superior esquerdo. Uma curiosidade: eu tinha escrito, não sei porquê, o nome da Confeitaria errado: “Márcico”! Pois um dos traços, talvez o mais carregado, cortou precisamente o c  que estava a mais! Deixei de escrever. Ainda tentei explicar na altura o fenómeno, mas Deus dissuadiu-me, isto é, eu sentia que não devia fazê-lo. Era isto que querias, Jesus? Estás tão calado...

    Eu tenho vários processos de fazer ouvir a minha voz.

   (Vagamente tudo vagamente! senti que deveria escrever “Minha Voz” com maiúscula. Mas pensei também que talvez fosse só por influência das mensagens, Mensagens, ditadas à Vassula. Jesus, porém, de forma clara, mas pouco “audível”, atalhou logo:) E se fosse?

   Jesus, meu Jesus, meu... não sei como diga... meu enorme, gigantesco, incomensurável Deus Criador, Voz Tremenda que no Princípio disse e tudo foi feito, meu querido, terno Mestre ... Ai é verdade: a Ternura! A Ternura. Estávamos algures a falar na Ternura ...

   São 11 horas. Vai imediatamente para a Missa! Corre![2]


   (12:45 horas. Saí da Missa e invadia-me um enorme desejo de continuar a escrever)

   Quero que contes tudo.

   Estou feliz por fazer o que Tu queres: cheguei à Missa atrasado. Estava-se a ler já o salmo responsorial após a I Leitura. Era para mim.

   Que ouvias?

   Não me lembra. Sei que era para mim.

   Queres fazer um esforço?

   Tenho medo que não resulte. Não sei... Tenho medo de te estar a pôr à prova...

   Escreveste te com minúscula!

   TE!

   Sim, e depois?

   Depois tudo parecia dito para mim especialmente. A Epístola de S. Tiago: a fé sem obras é morta. A antífona a seguir.

   Antífona?

   Aclamação do Evangelho? Já não sei como se chama.

   Estiveste muito tempo longe...

   Acabou por ser bom esse tempo, não foi?

   O Evangelho.

   Sim, o Evangelho era de Marcos: “Quem dizem os homens que Eu sou”? A resposta de Pedro: “Tu és o Messias!” Assim com todas as letras! Exactamente o que o povo judeu esperava. Mas quando Tu a seguir dizes que vais sofrer, Pedro escandaliza-se. Ele não conhecia os teus, Teus caminhos. Os caminhos da Libertação. Porque lhe chamaste Satanás? Ele tinha o poder de te, Te tentar?

   Ele era naquele momento a autêntica voz de Satanás em todos os tempos!

   Depois, no Evangelho, a mensagem: é preciso levar a Tua Cruz e seguir-Te. Exactamente para mim! Estava admirado de esta mensagem vir em Setembro: julgava que deveria estar inserida na Quaresma.

   Mas não é tudo.

   Não. Ao dirigir-me para a Missa senti um impulso, um desejo de me colocar junto à porta do fundo, eu que sempre me coloco à frente. Sentia ressoar dentro de mim a palavra do fariseu e do publicano.

   No lugar onde te sentaste, que aconteceu?

   Estava uma criança minha conhecida. Ela sorriu-me. Estavam outras à beira. O Vítor, o pequenito que eu conheço, foi-me informando que os outros eram todos seus irmãos e irmãs. Comecei a olhar para todos. Acariciei-os, meti conversa com eles, mais com gestos do que palavras. Sentia-me muito feliz. Ao mesmo tempo estava muito atento, vivendo a Missa.

   Conseguias?

   Perfeitamente.

   Disseste à tua filha que irias ter com ela para irdes almoçar fora. Vai. Bom almoço.


   (Regresso à Confeitaria. São exactamente 18 horas)

   Tenho receio de não conseguir escrever aqui.

   Porque não sais? Preciso de silêncio.(Levanto-me e saio. Já em casa, à escrevaninha da L.:) Não estás melhor aqui?

   Sim, mas... a minha mão não quer mexer-se... Paro... Silêncio e vazio por dentro. Que faço?

   Reza. Sabes que Eu estou contigo.

   Sim, mas...

   Reza.

   O quê?

   Rezar o que é?

   Pedir?

   Pedi e recebereis.

   Jesus, move a minha mão! Envia o Teu Espírito e aquece o meu coração! Põe o Teu dedo no meu coração! Põe o Teu dedo no meu ouvido e cura-me.

   Ajoelha-te! (Executo)

   Continuo vazio.

   Deixa o Espírito falar em ti.

   Como se faz isso?

   Deixando.

   Peço? Espírito Criador, reza em mim!... Não acontece nada!

   Já aconteceu!

   Como assim?

   Não estavas a contar o teu dia?

   Jesus, a frase não está muito correcta.

   Obrigado, senhor professor! Vá, que estás à espera?

   Devia ser “ de que estás à espera”.

   Não dás para mais hoje. Enredas, enredas... Conta o que se passou no teu dia de hoje.

   Assim sem te ouvir?

   Não tenhas medo. Ouço-te eu... Emenda: EU!

   Vês, Jesus, sai tudo mal!

   Não sejas engonha. Conta. Onde íamos?

   Nas crianças. Sentia-me muito feliz acariciando os pequeninos!

   Mais.

   Eu tinha pensado que hoje seria o dia  de me revelares mais um pouco – eu queria um muito! – o Mistério da Eucaristia...

   Pensas demais. E?

   E fui à comunhão. Hesitava se receberia a Hóstia na mão ou na língua. Queria recebê-la na língua, mas como toda a gente a recebia na mão, não quis armar-me em humilde. Mas imediatamente antes houve alguém que a recebeu na língua e eu fiz o mesmo.

   Porquê?

   Parecia-me o dia em que me querias ensinar a Humildade. Receber a Hóstia na mão é sinal de cristão “emancipado”...

   E tu não queres ser emancipado?

   De quem? De Ti? Não! Quero o contrário!

   E depois?

   Depois de receber a Hóstia senti uma coisa estranha... Frieza misturada com amargura... Não sei definir. Imediatamente interpretei isto como um sinal da minha indignidade. Decididamente, eu achava que Tu hoje estavas decidido a mostrar-me a minha pequenez, o meu nada.

   Nada?

   Sim, mais ou menos. Às vezes julgo-me alguma coisa, grande coisa às vezes, mas queria muito sentir-me mesmo isso: nada.

   Vá, anda. Conta a da Confissão.

   A certa altura da Missa senti que me devia ir confessar ao Padre P.

   Custou-te?

  Surpreendentemente, não. Eu há muitos anos que não me confesso. Achava que não era preciso... e julgava-me “emancipado”! Mas Tu, através da Vassula, mandaste-me confessar todos os meses! Que estopada! – pensei eu. Onde vou arranjar pecados para tantas confissões? Mas ficou-me esta da Confissão  martelando-me cá dentro. E foi muito descontraidamente que ao fim da Missa fui à sacristia e disse ao meu pároco, ao meu colega professor: “Quero-me confessar”. E surpreendi-me com a facilidade com que este pedido me saiu. Ele disse que não podia, mas ficava para um dia destes... Saí contente.

   Vamos ao passo seguinte.

   Jesus, parece-me que as Tuas perguntas são só-só imaginadas por mim.

   Conheces a minha resposta. Escreve-a.

   Todas as vezes – e foram já muitas! – que eu Te pus o problema de isto ser só imaginação minha, Tu sempre respondeste: “E a Imaginação não é uma faculdade que eu dei à criatura humana? Porque não haveria Eu de me servir dela?”

   Vamos ao passo seguinte.

   Desejava muito continuar a escrever. Mas apetecia-me também caminhar na rua como é meu costume, pensando em Ti, pensando em tudo isto. Hesitava no cruzamento. Neste preciso momento começou a chuviscar. Se me não vinha embora, molhava-me todo.

   E a chuva...

   Foi para mim um sinal de que Tu me querias a escrever.

   Mais. Está tudo?

   O  que veio a seguir também me prendeu a atenção: a minha filha esperava-me exactamente à porta. Queria ir comigo ao café. Fomos. Eu sabia que a J. não tinha cigarros, porque se lhe acabou o dinheiro. Eu sei o que é o vício do cigarro. Ela precisava mesmo de fumar. Tomou o café. Olhava, nervosa. Eu, que tinha comprado, momentos antes, sem ela ver, um maço de cigarros, pus-lhos sobre a mesa. Repentinamente espantada e feliz, disse: “Estava precisamente agora a ver a quem podia cravar um cigarro!” “Pois aí tens respondi eu Um milagre é isto!” E ela: “Mas pareceu-me mesmo um milagre!”

   E foi um milagre? Achas?

   Sim. Milagres não são só as curas espectaculares do corpo. Os maiores prodígios acontecem na alma, sem que ninguém os veja.

   Alto aí! Não devia ser Eu a dizer isso?

   E não foste? O que eu escrevi foste Tu que mo ensinaste!

   Mais nenhum prodígio, por hoje?

   Não sei. Mas conto. Disse à J. que íamos almoçar fora. Ela ficou contente. Mas sugeriu que não fôssemos ali à esquina. Queria ir mais longe... “E depois vamos tomar café àquele sítio...” acrescentou ela. Eu sabia: tratava-se de ir ao café onde ela foi há dias comigo candidatar-se a um emprego pedido por anúncio...

   Que tem isso de prodigioso?

   Vi nisso um outro sinal: ela quer muito aquele emprego e eu falei-Te insistentemente nele, para que lho desses.

   Depois de...

   Depois de ter pensado em pedir a alguém para meter lá uma “cunha”. Foi muito giro: nesse preciso momento ouvi-Te nitidamente: “E Eu, Salomão? E Eu?” Fiquei arrependido e triste por não me ter lembrado de ti, Ti.

   E agora? Acreditas que eu “meta a cunha”?

   Tenho medo, Senhor: não sei se tenho o direito de Te meter nestas coisas tão triviais, não sei se Te estou a pôr à prova, não sei se... Olha, pronto: tenho medo de acreditar cegamente e depois apanhar uma desilusão! Vês como eu estou? Sinto-me mal!

   Vá, ainda não acabaste.

   Mas estava feliz. A J. guiou os meus passos no princípio da tarde. Não sabia o que havia de fazer. Tinha projectado outra coisa...

   Tu e os teus projectos!

   É verdade: os meus projectos têm-me saído todos “furados”. Não executas nada do que eu projecto. Mau!

   Mau, Eu?

   Sabes que o disse porque gosto muito de Ti.

   Apesar desta frieza?

   Eu sei que amanhã me vais dar mil por este raquítico amor de hoje.

   Mil quê?

   Mil coisas que ninguém vê.

   Não faças literatura.

   Fica comigo, Jesus!

   Olha: e o texto da manhã?

   Sim, o texto da Escritura com que iniciámos posso dizer assim? a manhã! Eclesiastes, 9, 1: “Apliquei então o espírito ao esclarecimento de tudo isto e vi que os justos, os sábios e as suas obras estão na mão de Deus. O homem ignora se é digno de amor se de ódio. Tudo é possível”. Parecia exactamente aplicar-se a mim: “O homem ignora...”, “Tudo é possível”... E era isto um domingo, Domingo! Lembro-me agora que ao dar o maço de cigarros à J., perante o espanto dela, lhe disse: “Hoje é Domingo. O Domingo é o dia da generosidade”.

   Dando cigarros?

   Se com cigarros se puder curar a alma...

   Bela frase! Está tudo?

   Estou de joelhos, estive todo este tempo de joelhos, faltam cinco minutos para as 20 horas. Doem-me os joelhos, doem-me as costas, sinto-me mal por fora e por dentro... Não sei o que para aqui escrevi... Desconfio de que nada disto seja Teu!

   Repara que Eu não disse nada, a não ser que contasses o que te aconteceu. Contaste a verdade?

   Sim.

   Levanta-te. Eu  te abençoo.




[1] Um pequeno livro sobre as potencialidades fónicas do texto poético, que escolhi fazer, por imperativo profissional.
[2] Eu, que era padre e frade franciscano, havia abandonado todas as práticas religiosas a partir do momento em que deixei o convento e o ministério sacerdotal. Agora Jesus pede-me com veemência que as retome e leva-me a vivê-las com uma emoção nova. Em breve, porém, o Mestre me irá indicar outros rumos, inteiramente inesperados.

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