− Não distingues ainda a Minha Voz?
− Mas eu não ouço voz nenhuma! Eu só acredito!
− É a tua Fé que cria a Minha Voz?
− Não sei. As palavras aparecem-me no espírito e eu acredito em que Tu vais fazer delas Verdade.
− Mesmo que te sejam trazidas pelo pai da Mentira?
− Mesmo que sejam mentira!
− Dá um exemplo.
− Se me aparecesse no espírito “a Terra é quadrada”, a minha Fé tornaria Verdade esta mentira!
− A Terra passaria a ser quadrada?
− Passaria. Ou quadrado passaria a significar esférico!
− Já foram detectadas mentiras dessas na Bíblia, não já?
− Já: a Bíblia diz, de várias maneiras, que o sol sobe, que desce, que faz, enfim, o seu percurso à volta da Terra e a nossa ciência veio demonstrar que isso é mentira; a Terra é que gira à volta do sol.
− A Fé do escritor bíblico mudou a realidade?
− Não.
− As palavras que escreveu passaram a ter outros significados?
− Propriamente, não: levantar-se continuou a significar levantar-se, descer continuou a significar descer, girar continuou a significar girar.
− E a Bíblia não disse mentira nenhuma?
− Não!
− Dá esse outro exemplo que te desceu ao espírito.
− O milagre do sol, em Fátima: as pessoas viram o sol descer, subir, girar e a nossa ciência demonstra que a essa hora o sol não subiu, não desceu, não girou como as pessoas disseram, mas se manteve no seu lugar, como sempre.
− E as pessoas não mentiram?
− Não!
− A Fé delas tornou Verdade uma mentira?
− A Fé é que faz a Verdade, em cada momento.
− Que quer dizer “faz”?
− A Verdade não é um bloco geométrico, definido, acabado, que tenhamos que enfiar dentro de nós à medida que crescemos. Se assim fosse, ela seria um corpo estranho, descomunal que, se algum dia conseguisse entrar em nós, nos mutilaria e acabaria por nos esmagar. Também a Verdade é viva! Ela nasce connosco e cresce à medida que nós crescemos. Ao tentarmos exprimi-la, não importam as palavras que utilizemos. Como as crianças: elas às vezes dizem frio e a gente sabe que elas querem dizer calor.
− Não importam as palavras? Se para indicar a mesma realidade um disser frio e outro disser calor, como chegareis à Verdade?
− Não são as palavras que dizem a Verdade; é a Verdade que diz as palavras.
− Não estás apenas, agora, a fazer jogo de palavras?
− Não: foi assim que Tu me disseste e eu ouvi.
− Como ouviste?
− Senti a Verdade surgindo de dentro de mim.
− Deixa então a Verdade dizer algumas palavras que nos levem até ela.
− Não devemos procurar a Verdade nas palavras, mas dentro de nós. Ela aparece-nos, por vezes tão intensa, que parece romper-nos as paredes do ser. Aparece-nos sem palavras. Ela é Vida pura. É uma Força indomável, apenas. Só depois, quando tenta transmitir-se, se põe a dizer palavras, cada um as suas palavras, frágeis, inseguras, sempre deficientes como toda a nossa carne, traiçoeiras, tantas vezes.
− Mas então o mundo das palavras é uma Torre da Babel em que ninguém se poderá entender!
− É verdade, Mestre! Por isso alguns pegam nas palavras e põem-se a defini-las, dizendo que a Verdade é aquilo que eles assim definiram. Trata-se, é claro, da sua verdade, feita propriedade privada, em que admitem só os amigos e que impõem a muitos outros, transformando-os em escravos. E por esta via vai aumentando sempre, na Torre, a confusão e a dor.
− Seria então necessário eliminar todas as palavras para as pessoas se entenderem?
− As palavras poderão ficar, por agora, enquanto os corações se não tocam em plena Luz, quando estiverem inteiramente libertados. Mas têm que ser restituídas à sua função placentária: servirão desse modo para proteger, apontar e canalizar para a Verdade que dentro cresce, o necessário alimento. Não mais precisaremos das palavras quando nascermos.
− Meu querido amigo, agora responde-Me a esta pergunta: sendo Eu o Verbo, a Palavra, não acabas de Me reduzir a uma placenta que depois do nascimento se deita ao lixo?
− Não, meu Senhor e meu Deus: eu acabo de dizer que a Tua Palavra é justamente a Verdade! Muito viva e forte no meio de nós. E só porque assumiu a nossa carne se deixou envolver pelas nossas palavras trôpegas, inseguras, traiçoeiras. Se as pusermos ao Teu serviço, Tu as abençoas e mesmo assim frágeis e deficientes elas Te revelarão como Palavra de Deus, cheia de Graça e de Verdade. Em Ti seremos um só.
São 7:33!
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