A dúvida é esta atenção vigilante. E ninguém poderá afirmar que é pequeno o sacrifício desta permanente tensão da sentinela. Os filhos da Luz caminham em território inimigo não para fugir dele e o abandonar, mas para o reconquistar. Na verdade, o território em que caminham é seu, é a sua verdadeira Pátria, que o Inimigo um dia, servindo-se da sua momentânea distracção ou fraqueza, lhes conquistou. Caminham por isso os filhos da Luz não para fora das Trevas, mas para dentro delas, cada vez mais para dentro, em direcção ao quartel-general do Usurpador, em direcção à fonte da Devastação em que encontram a sua Pátria, outrora viva e fecunda. É, pois, natural que não seja possível caminhar neste tenebroso reino sem uma vigilância apertada, vinte e quatro horas por dia, todos os dias da nossa vida. É claro que isto só é praticável se nos revezarmos, se a vigilância puder ser entregue a alguém em quem tenhamos plena confiança enquanto nos entregamos ao indispensável descanso.
Em relação a mim, não sei se mais alguém o fará senão o meu Amigo, Aquele que eu chamo o meu Companheiro do Deserto e que em todas estas páginas proclamo Deus, meu Herói, meu Pantocrator. É que pelos caminhos que os dois seguimos, até hoje não me encontrei com mais ninguém e o meu Companheiro continuamente me confirma este facto, adiantando mesmo, inesperadamente, que nem Ele próprio por aqui havia passado antes, por não ter tido ninguém que O acompanhasse. Por isso n’Ele exclusivamente confio para vigiar enquanto durmo, enquanto me ocupo das tarefas que tenho que executar ao serviço do Usurpador para poder ir sobrevivendo.
É, por outro lado, tão íntima já a confiança que o meu Amigo tem em mim, que também Ele me adormece já às vezes no colo, numa enternecedora atitude que me leva até às lágrimas. Ele, Deus, o Senhor do Céu e da Terra, confia já em que eu detectarei o perigo ao mais pequeno sinal e entrega-me já a vigilância enquanto descansa. Há qualquer coisa de infantil nesta atitude de Deus que não pode deixar de nos comover até às lágrimas. E agora julgo entender as palavras que Ele um dia pronunciou: “Sede prudentes como as serpentes e simples como as pombas”.
Sem comentários:
Enviar um comentário