É importantíssimo, na Bíblia, na vida de Jesus e dos Seus discípulos, o Deserto. Só com o empo vi com mais claros olhos este incontornável Mistério: o Deserto, o da Bíblia, o de Jesus e de todos os Seus amigos, é este mundo construído por nós, a que chamamos Civilização. Disse-me o Mestre um dia que não é para sairmos daqui, do Deserto; é para morrermos aqui, a fim de que tudo, aqui, ressuscite e seja novo.
21/10/96 – 4:27
Continuo dorido, mal disposto, desanimado.
Pareço-me ainda muito longe do meu Deus que há tanto tempo procuro, e cada vez
mais longe também de todos aqueles que eu sei estarem caminhando comigo por
estranhos caminhos neste mesmo imenso Deserto em que se consomem os meus dias.
Às vezes sinto-me muito só. É verdade que tenho o Céu todo comigo, mas não
tenho a Terra que me está prometida como herança e enquanto se não encontrarem
o Céu Novo que me vem sendo mostrado de fugida e a Terra Nova para onde se
dirige toda esta minha caminhada, reside a minha felicidade só na Dor e na
Esperança. Na Dor, porque sei que é de parto; na Esperança, porque sei que
dentro de mim germina o Redentor do mundo.
Escolheu o Pai para mim este caminho de
solidão e é na consciência deste facto que tem origem toda a minha felicidade,
porque sei que tudo quanto o Coração do Pai decide Lhe sai perfeito das Mãos
poderosas e fatais. Esta minha solidão acentua-se à medida que visito as
igrejas não católicas. Também ali, em todas elas, Jesus parece morto. Nada tem
a ver, pelo menos, com o Jesus que aqui jaz comigo no Deserto, tão companheiro,
tão amigo, tão nosso. Todo carne viva, esgotado de caminhar, como eu. Neste
momento dorme um pouco aqui ao meu lado. Contemplo-O assim, neste breve momento
de repouso. E do Deus que vejo nas igrejas nada vejo neste Homem tão meu Amigo,
tão amarrado à minha solidão: este Deus que aqui jaz é de carne e queixa-Se e
esgota-Se e dorme enquanto Lhe escrevo as dores e a teimosia e os sonhos. Não
parece nada ter no Coração o conhecimento dos confins do Universo e nas Mãos as
alavancas que o comandam. Mas tem. E é caminhando assim junto da gente que Ele
o mostra. É que um caminho destes não vejo ninguém segui-lo, mas com o tempo
vai-se vendo que é o caminho do Amor mais puro, tão novo, tão surpreendente – e
tão simples! – que nos espantamos com a gigantesca e complicada pirâmide que as
igrejas construíram para nela encerrarem um Deus embalsamado…mas morto!
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