O Mistério
que celebramos no Natal é porventura a Impossibilidade maior, a Loucura maior
que possamos conceber. Nada há aqui de racional. O Criador das galáxias não
poderia nunca estar contido naquele Menino esperneando numa manjedoura, pequenino
e frágil como todos os nossos meninos, recém-nascido de uma mãe como todas as
nossas mães. O Mundo de que nos vem falar este Menino não tem mesmo nada a ver
com este que edificámos. Ora ouça-se:
A força das coisas do Céu está em
serem sempre Mistério. E o Mistério, ao ver-se, não fica visto, mas transforma
em Mistério aquilo que se viu, de tal sorte que o seu poder aumenta, o seu
colorido se multiplica, o seu fascínio se intensifica até à “felicidade
insuportável”.
Não, não é com explicações que vos levo lá, meus irmãos. Quando muito,
podem estas palavras tornar-se instrumento do Espírito para vos tocar o
coração, despertando-o para ouvir e para ver. As minhas palavras são só uma
tentativa frágil e desajeitada de revelar o que eu próprio ouço, vejo e capto,
enfim, com os cinco sentidos.
…
Deus não cansa nunca. Quando ouvimos dizer de alguém que se afastou d’Ele, cansado, é porque não chegou nunca a conhecer o Coração de Deus, nem nunca se envolveu neste conhecimento com o seu coração; quis conhecer, quando muito, com a cabeça e a cabeça só sabe moldar tudo em instrumento para a sua própria utilidade. A cabeça sempre pretendeu encaixar Deus nos seus próprios limites e, se o conseguiu, transformou-O num deus privado, estéril; se o não conseguiu, cansou-se d’Ele e rejeitou-O.
Foi isto que fez a Igreja a partir do momento em que fechou a Deus o seu coração e procurou compreendê-Lo com a cabeça. Por isso O transformou em leis, em dogmas, em Doutrina, enfim. É um sacrilégio horroroso tentar compreender Deus. (Dl 28, 22/4/04)
...
Quando apresento a alguém que se diz cristão alguma coisa vista neste
convívio com Jesus, é frequente ouvir esta resposta: Sim, isso eu já sabia. E
eu fico como que congelado por dentro. Como posso derrubar a fortaleza do Saber,
onde o Diabo encerrou as pessoas?
A Razão, deusa deste mundo é, de facto, a grande arma assassina de
Satanás. Ela rodeou os Mistérios de altas muralhas e solidificou-os em
proposições doutrinárias: quem as estudou e fixou na sua memória sabe, obviamente,
tudo o que há a saber acerca do Mistério; toda a novidade, pois, só pode vir da
investigação dos sábios que, uma vez descoberta, logo é delimitada e modelada
segundo a conveniência e o lugar do Sistema em que se vai encaixar daí em
diante. E torna-se, portanto, só mais uma coisa que é preciso saber. Não é difícil meter mais este
dado na memória. Depois, é só encaixá-lo na memória da generalidade das
pessoas, segundo a prudência dos doutrinadores.
Quando nos apaixonamos não é nada assim: qualquer movimento do nosso
apaixonado é uma novidade e ele nunca faz dois movimentos iguais!… (ibidem, 23/4/04)
Veja também o texto 107 (junho 2010)
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