10/8/00 — 10:18:35
Todos estes milhares de páginas fazem um único e mesmo apelo: procura Jesus, até O encontrares; tudo o resto te será dado por acréscimo. Sobretudo me arrebata o coração este segredo que nele tenho guardado: se todos procurarem Jesus e O encontrarem, cada um voltará diferente. Diferente do que era. E diferente de todos os outros!
Por isso nunca eu posso prescrever nenhuma norma de conduta para ninguém. Aquele que encontrou Jesus, encontrou a absoluta Liberdade - uma força tão poderosa, que nem as mais férreas leis da Cidade conseguirão manter dentro de qualquer limite que lhe possam estabelecer. Sentir-se único é o maior poder da nossa vida: sentimos que por onde passamos se abrem alas de olhos pasmados, os mesmos olhos que antes nem sequer poisavam em nós. Não tem nada a ver esta nossa situação com aquela que eventualmente já nos distinguia no mecanismo da Cidade: antes éramos especiais dentro da uniformidade; agora somos especiais dentro da diversidade.
Só em Jesus podemos readquirir o nosso carisma específico. Só n’Ele podemos descobrir e assumir a nossa vocação. Só n’Ele podemos saber quem verdadeiramente somos. Nenhum lugar na Cidade nos permite ser o que somos; antes nos violenta de forma dramática até reduzir a nossa inesgotável riqueza a uma peça incapaz de se renovar e portanto de se conhecer. Perdemos na Cidade completamente a noção de quem somos: somos nela só a peça que ela própria moldou, reduzindo toda a nossa variedade e força a um objecto de contornos geométricos, desvitalizado, inalterável. Podemos até ser diferentes de todos os outros elementos da engrenagem; somos, no entanto, sempre iguais, sem capacidade de surpreender ninguém para lá da primeira vista de olhos que sobre nós lancem. A maior parte de nós, na Cidade, nem sequer atrai o primeiro olhar dos transeuntes: somos só como parafusos que apenas despertam a atenção do dono da máquina e unicamente quando enferrujamos e ele tem que nos substituir.
Ninguém se “realiza” em nenhuma profissão da Cidade, mesmo que atinja aí o cume máximo da celebridade entre os seus concidadãos. Podem as palmas das multidões anestesiar por momentos ou até durante longos tempos a dor de se ver monstro; pode até a mutilação ter ido tão fundo, que lhe tivesse mesmo sugado a consciência da sua original grandeza divina; pode ele estar morto até ao cerne do seu coração: nos momentos de silêncio absoluto em que não há palmas nem olhares encandeados de nenhum espectador, o próprio movimento das células em decomposição falará, como em imensa catedral, da imortalidade perdida. E, nem que seja só um instante, um tremor de angústia abalará todo o corpo do herói.
Não, não há lugar na Cidade que favoreça o desabrochar da irrepetível individualidade de cada um. A Cidade profissionaliza todos os carismas e deste modo os reduz à função que lhes destina no seu próprio projecto, sempre efémero, sempre destinado à ruína. E com a ruína da obra projectada e até eventualmente realizada em amplitude superior ao previsto no projecto, morrem todos os profissionais que nela trabalharam, porque também as profissões pertencem à obra, como se fossem pedras ou pilares de cimento armado.
Isto que escrevo pode ser muito duro de ouvir, será até por toda a gente considerado como mera força de expressão. Mas o coração do filho de Deus que Jesus está erguendo em mim sente ainda muito frouxa a linguagem que usei para exprimir a realidade que ele está vendo: a Cidade destrói mesmo, até à ruína completa, a inexprimível diversidade e força dos carismas sonhados pelo Criador para cada uma das Suas criaturas. Quanto mais espectacular é o êxito da Cidade, mais profunda e trágica é a destruição da Variedade divina da Criação.
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