Muitos me hão-de acusar de eu me assumir como um iluminado. Mas esta acusação é absurda em si mesma: ela pressupõe que ser iluminado é crime. Ou então que o verdadeiro iluminado nunca se deve assumir como tal, porque uma tal atitude é necessariamente presunçosa e portanto aquele que a assume necessariamente um falso iluminado. Isto implica necessariamente esta estranha conclusão: o verdadeiro iluminado nunca sabe que o é ou, sabendo-o, nunca o poderá reconhecer publicamente.
Ora se há coisa que dentro de nós se torna clara quando nos convertemos é que estávamos cegos e passámos a ver. E como pode alguém que sempre foi cego e de repente começou a ver negar ou não assumir a diferença radical entre uma situação e outra? Que sentido teria um cego que passou a ver continuar dizendo que não vê? Por medo? Por vergonha? Por qualquer conveniência? Por humildade? Admitimos facilmente que aquele que de repente passou a ver fique, num primeiro momento, paralisado de assombro ou de felicidade. Mas poderá ele continuar fingindo que não vê? O que não nos custa imaginar é a pena, ou a inveja, ou a raiva de todos os outros, se o milagre tiver acontecido em terra de cegos. Mas é exactamente isso que acontece quando alguém se converte. Foi isso que aconteceu comigo: é impossível não constatar com plena segurança que estava cego e passei a ver e que a terra onde eu vivia era de facto uma terra de cegos. Não me posso, pois, admirar nem da solidão que sinto, nem da perseguição que venha a sofrer.
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