A paixão
por Jesus absorve-nos completamente. Mas a Pólis, ou a Cidade, ou, como nós
dizemos, “esta vida” é o poder contrário, que igualmente nos absorve por
completo, mesmo que não desperte em nós qualquer paixão, mesmo que o
detestemos. Toda a verdadeira Conversão nos lança necessariamente nesta tensão,
neste dilema…
25/9/95
–v 1:13
– Que medos ainda conservas?
– O de não escrever exactamente a Tua
Vontade.
– Diminuiu, esse medo?
– Muito. Sinto que estou adquirindo uma
confiança ilimitada na Tua Presença que me está atingindo e controlando
progressivamente todo o ser.
– Como notas isso?
– Por exemplo: já quase nunca me imagino no
placo. Há uma intimidade maior e
exclusiva Contigo.
– Queres dar outro exemplo?
– Há uma esperança muito grande em que todas
as minhas tarefas domésticas e profissionais se realizarão a seu tempo, sem
atropelos, na medida justa, com uma eficácia centuplicada.
– Acho que há uma reserva a fazer, não?
Eficácia…
– Eficácia no sentido da construção do Teu
Reino e não da nossa Cidade.
– Não tens medo de um fracasso ao nível do
êxito escolar dos alunos?
– Já não tenho. Sinto-me tão bem este ano
nas aulas… Uma serenidade que a mim mesmo impressiona. E tenho já testemunhos,
até escritos, de que também impressiona muito favoravelmente os alunos. Eles
estavam tão habituados à correria, ao stress.
– E o programa?
– É isso! Estou sentindo este ano que vai
ser possível fazer as duas coisas:
cumprir o programa e desbravar nos alunos o caminho para o coração. Ah! Se Tu
estiveres comigo…
– Não Me sentes, nas aulas?
– Já Te sinto mais agora, em tudo o que
faço. Ainda ontem me deste ideias tão giras para as aulas… Ontem, Domingo! Mas
olha: tenho ainda medo de que isto seja um fogacho passageiro, que com o decorrer
do tempo eu deixe desmotivar os alunos, como o ano passado.
– O balanço do ano passado foi negativo?
– Negativo a nível de resultados
estritamente escolares; positivo a nível da caminhada para o coração.
– Qual foi o prejuízo, para os alunos?
– Nenhum. A rigor, nenhum: o que ficou por
saber não lhes faz falta nenhuma. O pior é que eles têm um exame oficial ao fim
deste ciclo de três anos e aí…
– Aí… que concluíste já?
– Que se a caminhada para o coração os
mantiver sempre motivados, os conteúdos programáticos podem ser assimilados com
solidez e sem esforço, como coisa secundária. É possível, sim. É possível dar a
César o que é de César! Ah, Mestre! Vem dar as aulas comigo e tudo será
possível!
– Mas ouve lá: não combinámos destruir a
Cidade?
– Pois combinámos. Porquê? Achas que assim
estou a ajudar a aperfeiçoá-la?
– Não estás?
– Não queria, de forma nenhuma. A verdade é
que eu tenho que continuar a dar aulas, não? E acho que seria desonesto enganar
o patrão, não dando nas aulas o que tacitamente me comprometi com ele a dar.
Que pensas Tu, Mestre? Eu não sei.
– Queres considerar um pouco o exemplo da
Minha vida em Nazaré e depois da Minha vida pública?
– Foste Tu que me disseste cá dentro mesmo
agora: Tu poderias ter vindo, através de uma efusão especial do Teu Espírito,
aos corações, apenas, como acontecia aos Profetas ou em épocas especiais no Teu
Povo. O sentido da Tua Presença física
entre nós foi precisamente exemplificar.
– Até a Cruz?
– Pois. A Cruz é o mais espectacular e por
isso mesmo o mais marcante exemplo. Um explosivo exemplo por que optaste. Um
exemplo tão definitivo, que nós, Teus discípulos, não mais poderemos alegar
como desculpa o desconhecimento do caminho que leva à salvação!
– Também nas aulas… é esse o caminho?
– Agora é que Tu me apanhaste! Não… Espera…
Nas aulas que Cruz poderá haver? Só se for exactamente esta sujeição à lei da
Cidade: as matérias inúteis, os testes, os exames, a rotina desgastante…
– E não é uma Cruz?
– Será! Será, sim, estou agora vendo! Será
uma Cruz purificadora, será a Tua Cruz se os alunos a descobrirem como um mal, mas como tal o aceitarem de
coração desperto para o Teu Reino, minando assim os fundamentos da Cidade e
provocando por fim a sua derrocada.
– O que é a escola, Salomão?
– É uma máquina de mutilar pessoas.
– Logo, faz sofrer.
– Faz. Ah! Já sei onde queres chegar: é
possível transformar um sofrimento destruidor em sofrimento redentor! É isto?
– É. Ajuda-Me a redimir a escola e toda a
vossa ciência.
– Ah! Quem me dera que os meus alunos
descobrissem a Tua Escola e a Tua Sabedoria! Quem me dera que Tu fosses o Herói
deles!
– Achas impossível?
– Não. Já não acho. Desde que Te descobri
como Pantocrator eu acredito que farás até o impossível. É, aliás, sempre o que
Tu fazes. O possível também outros fazem – até o Demónio!
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