– Irmã. Diz antes Irmã, agora! – interrompe a Maria, a nossa Irmã de Nazaré.
– Tu sabes, Maria, como hesitei em escrever a Maria…
– E porque acabaste por escrever o a?
– Porque no fim da linha só tinha espaço para uma letra: dava jeito pôr ali um a.
– Quem te vai levar a sério, Salomão?!
– Talvez as crianças…
– Vá lá: não foi só por causa do espaço que puseste o a…
– Pois não; foi porque me lembrei de que, ao falar dos meus irmãos e dos meus amigos, eu sempre lhe ponho antes o ou a, que nós chamamos artigos definidos.
– E que mais te levou a escrever assim?
– O lembrar-me de que também já escrevi o Jesus, justamente quando O considero meu Irmão e se cria no meu diálogo com o Céu um clima familiar em que eu me sinto criança…
– Escreve o que estavas pensando agora.
– Quando me refiro ao Espírito Santo, ponho sempre o artigo definido: digo sempre o Espírito, o Consolador, a Avalanche de Deus…
– Porquê?
– Não sei. Nós começamos a dispensar o artigo definido quando se trata de nomes próprios de pessoas que adquirem dimensão universal, que ficam célebres… Sempre o colocamos quando se trata de títulos, de características das pessoas…
– A universalidade, a celebridade, os títulos, as designações, alteram a relação dessas pessoas com a proximidade e a intimidade das relações normais entre as pessoas normais?
– Parece que sim.
– E é bom, isso?
– Não sei. No caso de Deus, ajuda a tomarmos consciência de que Ele é o Absolutamente Outro, o Santo…
– Essa Transcendência de Deus afasta-O de nós seres humanos?
– Eu sempre achei que sim, mas o meu Mestre vem-me ensinando a dizer “nós” e, para Ele, dizer é fazer-se, é ser.
– E quando dizes nós e dizes o Jesus sentes de qualquer forma que estás pondo em causa a Santidade de Deus?
– Não: a consciência da Santidade de Deus aumenta em mim sempre que Ele Se aproxima de mim e me aproxima d’Ele até ao “nós”. Aí a Transcendência transforma-se em assombro e em agradecimento, no meu coração.
– E quando dizes o Jesus em clima familiar…
– Aí a Transcendência transforma-se em protecção e segurança e eu sou um menino girando despreocupado com o meu Irmão Jesus num círculo afectivo de que não vejo o limite e por isso a ele me entrego sem nenhum cálculo nem medo.
– Olha: se dizes sempre o Espírito Santo, porque é? É porque Espírito Santo não é nome próprio, é só um título, ou porque é um nome que não é célebre?
– Ah, Mãe, agora baralhaste-me.
– Não digas Mãe, agora; diz apenas Maria!…
– Ah, Maria, agora baralhaste-me mais ainda…
A nossa Irmã Maria riu agora como já há muito tempo A não ouvia rir; com aquele riso que uma vez ouvi e nunca mais me esqueceu: ao mesmo tempo redondo e vibrante, quente e cristalino… Tão espontâneo e jovem este riso!… Entra cá dentro e agita-nos todo o ser… Mas esta agitação é serena e funda… Parece Ela toda passando para dentro de nós em forma de felicidade, apenas.
Ela não é, de facto, Mãe, agora; é uma Irmã, sim, mas uma Irmã vibrando desta maneira dentro de nós tem também algo de uma paixão nossa e d’Ela… Ela é a nossa paixão, a nossa enamorada enamorando-nos… É muito linda e muito jovem e sem mancha nenhuma esta nossa Irmã…e arde-nos dentro até à flor da pele como ardem os encantos das primeiras paixões… Apetece-nos cantar o Cântico dos Cânticos de novo, porque esta sensação reproduz exactamente a música que lá vem escrita!…
– Maria, minha Irmã, minha Irmãzita inocente de Nazaré, bem hajas por teres dito Sim ao nosso Deus! Tais coisas sinto nesse Sim, que nem sei se Tu própria atinges todo o seu infinito oceano de felicidade. Vem ensinar-me como se pode ser irmão e ao mesmo tempo puro amante.
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