12/11/96
– 8:51
A pouco e pouco fui entendendo a relação
entre o texto que o Mestre me trouxe e a Ressurreição: a riqueza é o maior
obstáculo à Ressurreição. Ressuscita-se à medida que se caminha para a Casa do
Pai. Mas está tão longe de lá o nosso corpo assim ferido de morte, a tamanha
desolação veio parar o nosso ser, que a caminhada do regresso só pode ser longa
e penosa. Mais ainda porque Jesus não nos encurta o caminho, conforme nos
revelou esta noite. Ele não nos arrebata pelos ares para nos colocar daqui
directamente lá, no Paraíso: o próprio caminho do regresso somos nós que o
escolhemos. A mim inundou-me de felicidade esta revelação do nosso Deus:
durante toda a escrita daquele texto havia uma agitação feliz em todo o meu
ser, ao ir constatando que Deus não só respeita, mas ama todos os carreiros que nós escolhemos para regressar ao Lugar
da nossa mais funda saudade. Ama, porque são para Ele surpresa as escolhas que
vamos fazendo. Gentes, olhai: o Senhor das galáxias caminha junto de cada um de
nós, surpreendido e feliz com os inesperados atalhos por que em cada momento
nos metemos. Como se dissesse, de olhar brilhante de encanto: É por aí que
queres ir? Vamos por aí! Depois apenas nos alerta para os perigos, nos põe o pé
onde Ele sabe que é sítio firme, nos recebe os lamentos, quando verificamos que
nos enganámos, com uma Ternura tão inesperada, que por Sua vez nos deixa
suspensos de encanto!
Vede agora, gentes: como pode um caminho
destes, tão longo e acidentado e mágico, ser compatível com o apego a riquezas
deixadas lá atrás? Como podemos caminhar assim nesta permanente emoção da
surpresa, com uma pesada carga às costas? Ah, gentes, é tão simples de
entender, não é? Vinde experimentar este caminho que no fundo sabeis
necessário, porque corresponde ao mais fundo desejo da vossa alma: vereis que
todas as vossas riquezas se transformam sucessivamente em trastes inúteis, em
trambolhos ridículos, em pesos insuportáveis que com uma alegria nova alijareis
das costas, como quem se liberta de uma carga de excrementos malcheirosos. E
ficareis um momento parados, a perguntar como foi possível viverdes naquilo,
andardes a acarretar aquilo, transportardes aquilo durante tanto tempo às
costas! Mas tapai o nariz e olhai pela derradeira vez o saco que deitais fora: não
é só dinheiro o que lá vereis. Vereis também lá doutrinas, por exemplo. E
dogmas. E valores morais. E imensas instituições de caridade. Até prémios Nobel
lá vereis. Então atirareis o saco para um barranco, com sincero desprezo.
Tereis finalmente reconhecido que esta caminhada só pode ser feita de costas
leves, de coração liberto.
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